Por AlbertoLuiz Massabni
Donato era analfabeto. Nem mesmo sabia se o tinha feito cristão.
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A quebra de 1929 despovoara a fazenda. Roças em abandono, cafezal desertado. Os patrões nivelados na miséria e penúria dos colonos e camaradas. Aos oitenta anos, o preto Donato foi um dos poucos que ficou. Tinha as mãos grossas, calejadas, ásperas, mãos que não conhecera afagos e nem carícias. Vivia descalço os pés esparramados e os calcanhares endurecidos diante de tanto trabalho. Donato vivia num casebre pobre com poucas mobílias quase todas doadas pelos conhecidos, sua comida era pouca e pobre, quando tinha arroz, não tinha feijão, a farinha era certa na mesa. Sozinho, aonde iria? Chegara criança á fazenda e no caminho que lhe traçara a velhice viera ao seu encontro. Donato era analfabeto. Nem mesmo sabia se o tinha feito cristão. Nascera para servir. Sentado na soleira da porta, tirava longas baforadas de seu pito de barro, ficava olhando o céu, e vinham às lembranças dos seus ancestrais, procurava adivinhar as feições de sua mãe, e como seria o seu pai que nunca viu. Recolhia-se para dormir, antes do pio da coruja, com freqüência sonhava e revivia os batuques da juventude, o sino do feitor logo cedo convocando para mais um dia de trabalho nos cafezais. O sol que aquecia era o mesmo que confortava. A vida era só lembrança e seus sonhos foram interrompidos em uma noite com violentas contorções e repuxos, foi ao chão, tentou gritar, abraçou a terra nua de seu rancho, seus grandes olhos amarelos se fecharam para sempre. O velho escravo marchou para o campo dos mortos, enterrado numa cova rasa, coberto por um lençol de terra e uma cruz sem nome. Donato, um ser humano, um filho de Deus que viveu em uma terra distante e ajudou com seu trabalho a construir o nosso Brasil. |
domingo, 13 de janeiro de 2013
Um ex-escravo- Chamado Donato
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